A Ponte sobre o Estreito de Messina é, há décadas, símbolo de uma visão ambiciosa: conectar a Sicília à Calábria por meio de uma infraestrutura fixa, reduzindo a distância física e logística entre a ilha e o restante da Itália. Idealizado pela primeira vez nos anos 1970, o projeto voltou hoje ao centro da agenda política como uma das obras públicas mais debatidas e relevantes da Europa.
A infraestrutura, com mais de 3,6 quilômetros de extensão e um vão central de 3.300 metros — o mais longo do mundo para uma ponte suspensa de vão único —, prevê um investimento total estimado em cerca de 13,5 bilhões de euros. Segundo projeções do Ministério das Infraestruturas, a obra poderá gerar mais de 100 mil empregos diretos e indiretos, com um impacto econômico potencial de mais de 20 bilhões de euros, entre efeitos positivos para o turismo, a construção civil e a logística.
A ponte é considerada essencial também para o desenvolvimento dos portos de Gioia Tauro e Messina, que se tornariam polos estratégicos nas rotas comerciais do Mediterrâneo. Além disso, melhoraria as conexões ferroviárias e rodoviárias, reduzindo o tempo de travessia de 70 para apenas 15 minutos, com significativa diminuição das emissões devido à redução do uso de balsas.
No entanto, permanecem fortes as preocupações ambientais. Organizações ecológicas alertam para o risco de impactos no ecossistema marinho do Estreito, uma área de alta biodiversidade e sujeita a fortes correntes. Há também críticas quanto à sismicidade da região e à atualização do projeto, baseado em estudos realizados há mais de vinte anos.
O papel do Tribunal de Contas e os impasses do projeto
A recente intervenção do Tribunal de Contas suspendeu temporariamente a execução da deliberação do Cipess, que aprovava o plano econômico-financeiro da obra. Os magistrados identificaram questionamentos sobre as fontes de financiamento, as estimativas de tráfego e a conformidade com as normas europeias, que proíbem um aumento superior a 50% nos custos iniciais sem a realização de nova licitação. O Tribunal ressaltou que sua função não é política, mas de proteger o uso correto dos recursos públicos e garantir a legalidade administrativa, conforme previsto na Constituição italiana.
De acordo com as previsões atuais, o canteiro de obras — uma vez desbloqueado — deverá exigir pelo menos 7 a 8 anos de trabalhos, com conclusão estimada por volta de 2033, salvo novos atrasos.
O embate político
O debate sobre a Ponte volta a dividir os dois principais polos políticos italianos.
De um lado, a centro-direita, liderada pelo ministro das Infraestruturas Matteo Salvini, considera o projeto “uma prioridade nacional capaz de revitalizar o Sul e reforçar a competitividade da Itália no Mediterrâneo”. Forza Italia e Liga destacam o valor gerado em empregos, a atração de investidores estrangeiros e a necessidade de superar o que chamam de “burocracia paralisante”.
Do outro lado, a centro-esquerda, liderada pelo Partido Democrático (PD), questiona a sustentabilidade econômica e ambiental da obra. Os democratas denunciam a “pressa do governo” e pedem transparência sobre os custos e riscos legais. “O Tribunal de Contas — lembram — garante a legalidade no uso dos recursos públicos, e seu trabalho deve ser respeitado”.
Uma ponte entre sonho e realidade
A Ponte sobre o Estreito permanece, assim, suspensa entre duas visões: a de quem a considera um símbolo de modernidade e desenvolvimento para Sicília e Calábria, e a de quem teme que se torne uma obra inacabada e de custos insustentáveis.
O certo é que, entre avanços e paralisações, o projeto continua a representar um dos maiores desafios de infraestrutura e de política da Itália, capaz de colocar novamente em pauta o delicado equilíbrio entre crescimento, legalidade e proteção ambiental.

