Florença, 22 de dezembro de 1998
Ainda estou envolto no edredom quando, ao longe, escuto as vozes dos meus pais. Eles já estão de pé, imersos nos preparativos da viagem. Minha mãe explica ao meu pai o que carregar primeiro e o que deixar por último, como se aquela ordem pudesse realmente manter tudo unido: as malas, o tempo, as emoções. Em seguida vem o barulho dos aquecedores que voltam a funcionar, a respiração quente da casa tentando se defender do frio. É nesse momento que meu despertar ganha forma, lento, inevitável.
Sessenta e oito degraus separam meu apartamento aquecido da rua gelada. Sessenta e oito. Conheço cada um de cor. Malas, sacolas, presentes carregados às pressas. O céu está baixo, fechado, o frio corta o rosto e uma garoa fina completa o cenário. O Natal se anuncia assim, sem efeitos especiais, mas com uma solenidade silenciosa que entra na gente sem pedir licença.
Para nós, italianos, essas viagens não são simples deslocamentos. São provas de resistência emocional. Quatrocentos e setenta quilômetros, quatro horas e meia de estrada: uma eternidade. Hoje moro no Brasil, e aqui isso seria quase normal. Mas na Itália, não. Naquela época, aquela viagem era a viagem. A viagem do ano. Aquela que se preparava nos dias anteriores e se contava nos dias seguintes, como um ritual.
Chegamos a Cimitile, um vilarejo minúsculo na província de Nápoles. A terra da minha família. Sempre me lembro daquele leve cheiro de lenha queimada: ao redor, muitos campos, era o tempo de queimar as ervas secas. Para mim e para meu irmão, era um mundo à parte. Nós crescemos em Florença, sempre viva, sempre cheia de turistas, famosa no mundo inteiro. Aquele vilarejo tão pequeno, tão imóvel, era feito de raízes profundas, mas também de uma sutil sensação de estranhamento.
Eles nos chamavam de “os florentinos”, por causa do sotaque.
Ali, todos se conhecem. Eu e meu irmão, ao contrário, quase não conhecíamos ninguém. As poucas luzes de Natal penduradas pelas ruas nos lembravam que sim, era Natal.
Primeira parada: os avós paternos. Salvatore e Maria. Os avós com quem mais vivi a infância, mesmo vendo-os no máximo duas vezes por ano, no inverno e no verão.
Na casa do nonno Salvatore havia o verdadeiro tesouro: a maquete do trem elétrico. Uma pequena cidade construída inteiramente por ele, ex-funcionário da Enel, agora aposentado. Uma maquete enorme, cuidada em cada detalhe. Eu e meu irmão passávamos horas brincando ali, sempre sob o olhar atento do nonno. Era a forma dele de estar presente, de se sentir ainda necessário.
Segunda parada: a pracinha do vilarejo, na casa da nonna Angela. A mesma recepção, imutável:
“Eee Francesco, como você cresceu, como está bonito!”
Depois vinha a comida, os doces, em quantidades impossíveis. E o momento inevitável em que ela chamava a mim e ao meu irmão de lado, quase em segredo, para nos dar 100 mil liras. O presente que esperávamos o ano inteiro. Hoje seriam pouco menos de cinquenta euros, mas naquela época valiam muito mais: eram um símbolo, uma promessa, um gesto de amor.
24 de dezembro, véspera de Natal. Lembro como se estivesse gravado na memória. Meu avô tinha uma pequena placa de mármore e preparava o torrone. Nonno Salvatore era preciso como um cronômetro: meticuloso, organizado, silencioso. Sentado na cozinha, eu observava seus movimentos contínuos e atentos para não deixar o doce grudar. Era preciso mexer sempre. E que perfume chegava ao meu nariz.
Ele fazia isso ao lado de uma pequena porta de vidro que, toda vez que alguém entrava, deixava passar uma lâmina de frio.
Minha avó Maria, sentada ao lado da lareira, gritava inevitavelmente:
“Fechem a porta! Está entrando frio!”
Eu ria. Ela me olhava, sorrindo, e perguntava:
“Por que você está rindo, Francesco?”
Eu continuava rindo, e nos meus olhos se refletiam as chamas do fogo aceso na lareira. Como eu gostava de ficar ali, diante do fogo, sentindo o calor, sentindo-me protegido.
Chegavam minhas tias, irmãs do meu pai, com seus maridos e filhos. Beijos, abraços, vozes sobrepostas, gritos de alegria. Começavam os preparativos da véspera, o grande jantar. Talvez o jantar mais importante para nós, italianos. O evento gastronômico mais sagrado do ano.
Eram apenas cinco da tarde e todas as mulheres da casa já cozinhavam, conversavam, fofocavam. Os fogões no máximo, a cozinha cada vez mais quente. Meu avô, com sua calma habitual, arrumava a mesa em silêncio respeitoso. Não gostava de confusão. Ralava o parmesão com aquele ralador que lembro perfeitamente: redondo, de alumínio, com os furos nas laterais. Depois passava um garfo entre os dentes do ralador para soltar o queijo preso. Aquele som metálico ficou dentro de mim.
Muçarela de búfala, alcachofras em conserva, azeitonas verdes, crostini, frios. A toalha vermelha como pano de fundo. Éramos mais de dez à mesa. Hoje, tantos anos depois, entendo que não era apenas um jantar. Era um ritual. Uma forma de dizer que, apesar do tempo, das distâncias e das vidas diferentes, ali ainda éramos uma família.
Chegava o primeiro prato: o clássico espaguete com vôngole e molho de tomate, tradição napolitana. Pão em abundância para fazer a scarpetta. Depois, bacalhau frito, capitone crocante, salada de polvo. O jantar começava às oito da noite e terminava quando o tempo decidia parar. Às onze chegavam os doces: zeppole, mostaccioli, struffoli, castanhas, figos, tâmaras, profiteroles, panetones, pandoros. Uma verdadeira prova de resistência.
Depois de limpar a mesa, começava a tombola, mas na versão napolitana: cada número tinha um ditado popular. Os feijões secos marcavam a sorte nas cartelas. Os prêmios eram poucas liras, mas o verdadeiro prêmio era estar ali. Juntos. Entre olhares, abraços, risadas. Dentro do calor daquela sala, dentro do calor daquela lareira.
Hoje, meus avós já não estão mais aqui. Os gritos de alegria diminuíram com o tempo. Não sinto mais o cheiro do torrone do nonno Salvatore, nem os gritos da nonna Maria por causa da porta aberta, nem o sorriso da nonna Angela me esperando na entrada.
Mas o calor daquela lareira, os cheiros e os aromas daquela casa, nunca foram embora.
Vivem comigo.
Onde quer que eu esteja.
Feliz Natal, Família Sibilla.

