sex. ago 22nd, 2025

Do Vêneto ao Brasil: Língua veneta será ensinada em universidade brasileira como símbolo de identidade

A língua dos antigos navegadores da Sereníssima República de Veneza acaba de ganhar um novo espaço: o Brasil. A Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul, lançou oficialmente um curso universitário inteiramente dedicado à língua veneta, também conhecida como “talian” — uma herança linguística que cruzou o Atlântico no final do século XIX e hoje resiste como símbolo vivo da imigração italiana no sul do país.

A iniciativa é fruto de um convênio entre a UFSM e a Academia de la Bona Creansa, entidade dedicada à preservação e difusão da cultura e do idioma vêneto. O curso será ministrado pelo professor Alessandro Morcellin, diretor da academia, e terá 15 aulas com atividades práticas, exercícios gramaticais e leituras literárias em veneto — incluindo trechos de Carlo Goldoni e referências históricas como Marco Polo.

Um idioma que atravessa séculos

Mais que um dialeto, o veneto é considerado uma língua minoritária europeia, com estrutura própria e história literária consolidada desde a Idade Média. No Brasil, ele ganhou novos contornos com a imigração de centenas de milhares de italianos, especialmente entre 1875 e 1914, que se estabeleceram em estados como Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná.

Ao longo das gerações, o idioma se misturou ao português, criando o talian, uma variante híbrida falada até hoje em diversas comunidades, vilarejos e regiões rurais — muitas vezes longe das grandes cidades, mas sempre viva nas conversas cotidianas, canções e celebrações.

Patrimônio cultural do Brasil

O reconhecimento da importância do talian é relativamente recente. Em 2014, o idioma foi declarado patrimônio imaterial do Brasil pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A medida visou valorizar a memória coletiva de milhões de brasileiros descendentes de imigrantes italianos, especialmente os que vieram do Vêneto.

“Essa língua representa a alma de um povo que, mesmo longe de sua terra natal, nunca perdeu a identidade. O Brasil é hoje o maior ‘arquivo vivo’ da língua veneta no mundo”, destacou Roberto Ciambetti, presidente do Conselho Regional do Vêneto, ao comentar a iniciativa.

O renascimento acadêmico

O curso da UFSM é pioneiro entre as universidades federais e marca um novo capítulo no processo de valorização da cultura ítalo-brasileira. Além do idioma, os alunos também mergulharão na história da imigração, na literatura veneta e nas manifestações culturais que se espalharam pelo sul do Brasil, como a música, a culinária e os rituais religiosos herdados da Itália rural.

Essa é uma conquista que vai além da linguística: é um ato de resistência cultural e de reafirmação identitária. Em tempos de globalização e apagamento das tradições, o ensino da língua veneta nas universidades brasileiras reforça a ideia de que preservar a memória é tão importante quanto construir o futuro.

E para os descendentes de imigrantes italianos, talvez seja a hora de resgatar uma herança que nunca deixou de falar ao coração — mesmo que, por um tempo, tenha sido em silêncio.

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