seg. dez 22nd, 2025


Itália perde jovens para o exterior: a fuga dos formados que esvazia o país

PorLuiz Antônio Cafiero

22 de dezembro de 2025



A Itália vive um paradoxo silencioso, mas cada vez mais evidente. Hoje, há mais italianos vivendo fora do país do que estrangeiros residentes em território italiano. São cerca de 6,4 milhões de italianos no exterior, contra 5,5 milhões de imigrantes na Itália. Por trás desses números está um fenômeno que preocupa economistas, demógrafos e universidades: a saída crescente de jovens, muitos deles altamente qualificados, em busca de oportunidades que não encontram em casa.
O ano de 2024 marcou um recorde histórico. Mais de 155 mil italianos deixaram o país, com destaque para a faixa etária entre 18 e 34 anos, considerada a mais produtiva. Segundo dados do Istat, o número de expatriados jovens cresceu 48% em apenas um ano, enquanto a faixa entre 34 e 49 anos avançou 38%. Não se trata de um movimento episódico, mas de uma tendência contínua registrada desde 2013.
Instituições como o Istat, a Fundação Migrantes da Conferência Episcopal Italiana, o Observatório das Contas Públicas e a Fundação Nordest concordam em um ponto: a Itália não enfrenta apenas um inverno demográfico, comum a muitos países ocidentais, mas também uma erosão de capital humano que parte justamente das regiões mais desenvolvidas, como Lombardia e Vêneto. Nem mesmo essas áreas conseguem mais reter seus jovens talentos.
É verdade que parte do aumento dos italianos no exterior se explica pelo crescimento dos pedidos de cidadania por descendentes de emigrantes históricos, sobretudo na América do Sul. Ainda assim, o peso maior hoje vem dos jovens que emigraram recentemente, especialmente após a pandemia. O Covid freou temporariamente o fluxo, mas, a partir de 2022, a saída voltou com ainda mais força.
Entre 2022 e 2023, 46% dos que deixaram a Itália tinham diploma universitário. Um dado que ajuda a dimensionar o impacto econômico do fenômeno. De acordo com a Fundação Nordest, a fuga de jovens qualificados já custou 134 bilhões de euros à economia italiana, entre investimentos em formação e perda de produtividade. Para cada jovem estrangeiro que escolhe a Itália, oito italianos fazem o caminho inverso. E menos de um terço retorna.
Os motivos são muitos, mas os salários pesam. Um engenheiro de software na Itália ganha, em média, 34 mil euros por ano, contra 67 mil no Reino Unido. Um arquiteto recebe cerca de 24 mil euros na Itália e 66 mil na Alemanha. A diferença é ainda maior entre médicos italianos e franceses. O fosso salarial, porém, não se limita às profissões universitárias: ele também aparece entre enfermeiros, cozinheiros, motoristas e operários especializados.
Ainda assim, reduzir tudo ao dinheiro seria simplificar demais. A Fundação Migrantes propõe uma leitura menos apocalíptica: não se trata apenas de fuga, mas também de escolha, curiosidade e projeto de vida. Muitos jovens buscam sistemas mais meritocráticos, universidades mais conectadas ao mercado de trabalho e ambientes culturais onde se sintam reconhecidos. Segundo a rede United Italian Societies, que apoia estudantes italianos no exterior, o fator decisivo muitas vezes é a dignidade profissional e a possibilidade real de mobilidade social.
O problema é que, somados, esses movimentos estão redesenhando o futuro do país. Se nada mudar, a Itália pode perder 4,5 milhões de habitantes até 2050, não só por ter menos nascimentos, mas por voltar a ser, como no passado, um país de partida. Um país que forma talentos, mas os vê crescer — e produzir — em outros lugares.

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