Nos anos de ouro da moda italiana — entre as décadas de 1970 e 1990 — nomes como Curiel, Lancetti, Ferré, Mila Schön, Capucci ou Basile definiam a elegância e a identidade do Made in Italy. Hoje, muitos desses nomes sobrevivem apenas como citações em livros de história da moda ou como logotipos esquecidos nos registros de tribunais. Mas o que aconteceu?
O declínio dessas maisons não se deve a um único fator, e sim a uma soma de transformações econômicas, culturais e industriais.
1. A passagem do autor à marca. Nos anos 1990, a moda entra de vez no sistema do luxo global. Grandes grupos financeiros e do varejo — LVMH, Kering, Richemont — impõem lógicas de escala, comunicação e distribuição que privilegiam a força da marca mais do que o talento individual. Muitos estilistas-artistas, ligados a uma abordagem artesanal e quase poética, não souberam — ou não quiseram — transformar sua maison em empresa.
2. A dificuldade de gerir o legado.
Quando o fundador desaparece, a transição geracional costuma ser frágil. Faltam planos industriais, recursos para internacionalização e uma direção criativa capaz de reinterpretar o código original sem distorcê-lo. Ferré, por exemplo, era um arquiteto da forma e do volume, mas ninguém depois dele conseguiu traduzir essa linguagem para um código contemporâneo.
3. A mudança do gosto e da comunicação. A moda contemporânea vive de storytelling digital, influenciadores, capsules e contaminações urbanas. A alta-costura, entendida como exercício de pura elegância, tornou-se um nicho. Marcas como Curiel ou Lancetti, baseadas na sofisticação formal, acabaram falando uma língua de elite em um mundo que passou a exigir imediatismo, identidade pop e “instagramabilidade”.
4. O sistema Itália.
Diferentemente da França — onde as marcas históricas são protegidas e relançadas como patrimônio cultural —, a Itália nunca desenvolveu uma estratégia coletiva de preservação. Muitas maisons acabaram em mãos erradas ou simplesmente esquecidas, esmagadas por um sistema midiático que prefere o novo às histórias de continuidade.
Ainda assim, o legado permanece. Os arquivos de Ferré, as linhas arquitetônicas de Capucci, a feminilidade discreta de Curiel ou a intelectualidade de Lancetti representam um patrimônio estético e cultural ainda fértil.
Talvez a moda italiana, hoje obcecada pelo “novo”, devesse olhar mais para as próprias raízes — não por nostalgia, mas para reencontrar a profundidade de visão que a tornou grande.

