qui. dez 25th, 2025

O doce em forma de ferradura que guarda a alma de Marche.

PorStella Rimini

25 de dezembro de 2025 , , ,

Nas colinas altas de Marche, onde a cidade de Cingoli se debruça sobre uma varanda infinita para observar o Mar Adriático, o Natal não chega com o primeiro floco de neve. Ele chega quando o perfume da Sapa, o mosto de uva cozido por horas até virar mel — começa a escapar pelas frestas das janelas de pedra.

Ali, o Natal tem formato de meia-lua e nome de história: os Cavallucci.

Para entender o Cavallucci, é preciso conhecer a Vergara. Séculos atrás, nas cozinhas rurais e humildes, ela era a mestre da alquimia. Enquanto os homens cuidavam da terra, ela guardava o que restava da colheita como se fosse ouro. Nozes caídas, figos secos ao sol e o xarope escuro das uvas não eram apenas ingredientes; eram a resistência contra o inverno.

Com as mãos calejadas, mas carregadas de ternura, essas mulheres criaram um doce que desafiava a escassez. Elas não tinham açúcar refinado, então usavam a doçura profunda da terra. Elas moldavam a massa em formato de ferradura, uma homenagem aos cavalos que subiam as ladeiras íngremes da província de Macerata e, dentro de cada “cavalluccio”, escondiam um segredo de sabor.

Fazer um Cavallucci é um ato de paciência, quase uma oração. A massa, feita com a simplicidade do óleo e do vinho branco, precisa ser fina o suficiente para proteger, mas não esconder, o tesouro que carrega.

O recheio é um abraço denso: o crocante das avelãs e nozes se mistura à maciez das passas e dos figos. Hoje, o café e o chocolate trazem uma nota de modernidade, mas é a Sapa que dá a cor da alma ao biscoito. Ao contrário do Vino Cotto, que se bebe aquecido para espantar o frio, a Sapa é o xarope que une todos esses elementos em uma massa escura, aromática e eterna.

Degustar um cavalluccio é mais do que provar um biscoito: é sentir a história de Marche, a engenhosidade das mulheres que transformaram o simples em sublime, e o espírito do Natal italiano feito de família, memória e ritual. Cada mordida traz consigo o frio do inverno, o calor das lareiras e o sorriso das cozinheiras que, ao longo dos séculos, mantiveram viva a tradição.

O Natal não é apenas uma data no calendário: é uma experiência sensorial, um encontro entre passado e presente, onde a doçura dos cavallucci nos lembra que algumas tradições nascem para permanecer.

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