Roupas penduradas para secar ao lado das estátuas em Prato della Valle, em Pádua; campistas nus em Cortina d’Ampezzo, nas Dolomitas; mergulhos nas fontes de Roma; selfies escalando o Davi de Michelangelo ou abraçando o Baco de Giambologna em Florença. Os casos de desrespeito ao milenar patrimônio artístico e cultural da Itália são inúmeros — e as ações dos chamados turistas cafonas não param de crescer. São aqueles que usam obras de arte como cenário para palhaçadas em frente às câmeras, que cavam iniciais no Coliseu ou fazem piqueniques seminús aos pés de monumentos históricos.
Não é de hoje que visitantes em bermudas e sandálias tentam levar para casa um “souvenir” ilícito da Itália. Já houve turista que quebrou os dedos da escultura de Paulina Borghese. Em Veneza, mergulhos no Canal Grande e piqueniques improvisados em pontes viraram rotina, ao lado de saltos acrobáticos para as redes sociais.
Diante desse cenário, o governador do Vêneto, Luca Zaia, lançou a proposta de aplicar o daspo urbano contra turistas desrespeitosos que violam o decoro público. “Não somos um parque de diversões. Há um limite para tudo”, disse.
Originalmente criado para afastar torcedores violentos dos estádios, o daspo urbano é uma medida de afastamento temporário de determinados lugares. Hoje, prefeitos de várias cidades já aplicam a norma a turistas. Segundo dados oficiais, em 2025 foram emitidos mais de 9.800 daspos urbanos na Itália — um aumento de 27% em relação a 2024. Só em Roma, foram 1.300 medidas, das quais 400 contra estrangeiros. A infração mais comum? O banho ilegal nas fontes históricas, em alta de 30% em relação ao ano anterior.
Além do comportamento “cafona”, a Itália enfrenta o problema do overtourism: são mais de 73 milhões de visitantes por ano. O resultado é congestionamento nas cidades, danos ambientais e desgaste para os moradores locais. Para enfrentar o fenômeno, cada lugar busca sua própria solução. Veneza já cobra bilhete de entrada de 5 euros, Capri aplica rodízio de veículos (targhe alterne) e aumentou a taxa de desembarque na Costa Amalfitana também se experimenta circulação alternada de carros, enquanto na Sardenha e na Puglia introduzem apps e ingressos digitais para controlar o acesso às praias. A Cinque Terre, na Liguria, fiscalizam até os calçados: trilhas de chinelo podem custar 2.500 euros de multa. A chique Portofino proíbe comer sentado no chão ou circular sem camisa (multa de até 500 euros).
Entre regras, multas e controles digitais, surge a dúvida: será que a Itália corre o risco de se transformar em um museu a céu aberto, com ingresso e vigilância em cada esquina? Ou será que, sem disciplina, a beleza do país ficará cada vez mais ameaçada pelos excessos de visitantes?
A resposta, provavelmente, está no equilíbrio: turismo de qualidade sem abrir mão da liberdade nem da preservação.