ter. dez 9th, 2025

Entre o samba do Rio e a elegância de Roma: a rua mais cool do mundo e a joia italiana que resiste ao tempo

Time Out sempre teve um estranho poder: o de olhar para o mundo como quem abre uma janela e descobre que a vida acontece nos detalhes que quase ninguém nota. A revista nasceu em Londres, lá nos anos sessenta, quando a cidade fervia cultura, ruas, teatro, rebeldia. Hoje, continua sendo essa bússola inquieta que aponta não para o norte, mas para os lugares onde o coração bate mais forte. E quando ela decide escolher as ruas mais fascinantes do planeta, não está apenas criando um ranking: está revelando onde a alma das cidades ainda respira sem filtros.

E neste ano, duas ruas distantes milhares de quilômetros acabaram unidas por um mesmo destino, como se duas histórias paralelas encontrassem um ponto de encontro. Uma pertence ao Brasil, cheia de ritmo, suor, alegria, renascimento. A outra, à Itália, misteriosa, clássica, silenciosamente arrebatadora. O que há por trás dessa escolha? O que essas ruas sussurram para quem passa?

No centro vivo do Rio, Rua do Senado voltou a brilhar como se a cidade tivesse decidido repolir um pedaço de si mesma. Seu nome carrega a memória de um passado político intenso, ligado ao antigo Paço do Senado, onde decisões moldavam o destino do país. Não é bonito pensar que, antes mesmo da música, a história já ecoava por ali? Eleita a rua mais cool do mundo em 2025, ela não pede para ser fotografada. Ela pede para ser sentida. E quando você caminha por ela, percebe como o tempo pode ser generoso com certos lugares. A antiga boemia dos antiquários sobreviventes convive agora com restaurantes que reinventam sabores, bares que nascem com luz própria, gente que chega e gente que nunca foi embora.

E então chega o fim de semana e tudo muda de textura. A rua vira pista de dança, vira corpo coletivo, vira aquele tipo de alegria que ninguém ensina. O Samba do Armazém Senado faz com que até o asfalto pareça vibrar. Quem resiste a esse chamado? Entre o contemporâneo restaurante Lilia e a imaginação líquida dos coquetéis do Labuta, Rua do Senado se transforma em um diálogo vivo entre passado e futuro, tradição e reinvenção. E bem em frente, o Solar dos Abacaxis está devolvendo vida a uma antiga fábrica que promete nascer de novo como mercado cultural. O que será que Rio está preparando ali? A sensação é a de assistir a uma metamorfose no exato momento em que ela acontece.

Do outro lado do oceano, Roma guarda sua própria joia, Via Panisperna, sexta colocada entre as ruas europeias. É impossível não começar pelo nome, esse enigma delicado que provoca curiosidade desde sempre. Pane e perna, diz a tradição: o pão e o presunto, distribuídos pelos frades aos pobres, uma pequena esmola que acabou virando território. É bonito imaginar uma rua que nasce de um gesto assim, não é? Outros acreditam que o nome veio de antigas propriedades, de fronteiras esquecidas ou até de famílias que marcaram o bairro há séculos. Talvez nunca saberemos com certeza. E talvez o encanto esteja justamente nisso.

Via Panisperna se desenrola pelo rione Monti como se cada pedra tivesse guardado uma lembrança. Os palácios do século XVIII observam tudo com uma calma aristocrática. A igreja de San Bernardino da Siena, a elegância suspensa da Villa Aldobrandini, os ecos de vidas que passaram quase sem deixar ruído. Mas então surge a surpresa: nos anos 1930, essa rua discreta virou palco de um dos capítulos mais impressionantes da ciência moderna. Fermi e seus jovens físicos, os famosos “meninos da Via Panisperna”, caminharam por ali enquanto mudavam para sempre a compreensão humana do átomo. Hoje o Museu Enrico Fermi guarda essa memória no número 89, onde ciência e beleza se tocam de maneira quase poética. Em quantas ruas do mundo isso acontece?

E enquanto essas duas protagonistas, a brasileira que dança e a italiana que contempla roubam a cena, o mapa europeu traçado pela Time Out também revela outras histórias. No topo da Europa, apareceu a vibrante Rua do Bonjardim, em Porto, uma rua que parece misturar tradição portuguesa com uma juventude que não tem medo de reinventar tudo. Logo depois surge Maybachufer, em Berlim, onde o cotidiano se confunde com feiras à beira do canal e onde a cidade parece revelar seu lado mais íntimo.
Mas no fim, depois de tantas ruas, tantas cidades, tantas histórias, a pergunta continua ecoando como um sussurro inevitável: nós caminhamos pelas ruas… ou deixamos que elas caminhem dentro de nós? Porque as ruas que importam, as ruas que se tornam memória, são sempre aquelas que tocam algo que não conseguimos explicar e que talvez nem precisemos.

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