Um pequeno município da Basilicata, com apenas dois mil habitantes, Trecchina, guarda uma história que atravessou o oceano e contribuiu para fundar uma das cidades mais importantes do Estado da Bahia, no Brasil: Jequié. Esse é o fio condutor que uniu os protagonistas da conferência “Da Basilicata ao coração do Brasil: a história dos imigrantes italianos que fundaram Jequié”, realizada ontem na Câmara dos Deputados.
Após a Unificação da Itália, centenas de trecchineses escolheram emigrar para além-mar, impulsionados pelas dificuldades econômicas, mas também pelo sucesso dos primeiros pioneiros. Em Jequié, onde se estabeleceram entre o final do século XIX e o início do século XX, conseguiram construir comunidade, gerar empregos e iniciar atividades que marcaram profundamente o desenvolvimento do território. Hoje, a cidade conta com mais de duzentos mil habitantes e é a sexta mais importante do Estado da Bahia.
Durante o encontro foram narradas histórias de partidas e de integração, mas também de sucesso e de cultura. Como lembrou o deputado Fabio Porta, eleito na América do Sul, a emigração lucana foi uma força transformadora para toda a Basilicata, assim como os músicos de Viggiano ou os caldereiros de Nemoli. Luigi Scaglione, presidente do Centro de Estudos Internacionais Lucanos no Mundo, destacou como essas experiências deixaram uma marca duradoura na identidade lucana.
O Brasil, que hoje abriga cerca de 32 milhões de ítalo-descendentes, é testemunha da capacidade italiana de fundar cidades e enriquecê-las de valores. Um exemplo emblemático é justamente Jequié, fruto do espírito empreendedor de Trecchina. A conferência, moderada por Gianni Lattanzio (ICPE), contou com a participação de estudiosos e representantes institucionais, entre eles Domingos Ailton, Secretário de Cultura e Turismo de Jequié, a escritora Antonella Rita Roscilli, o professor Giorgio De Marchis (Universidade Roma Tre) e Iara Bartira da Silva, Secretária-Geral da Associação de Amizade Itália-Brasil.
Entre os temas mais atuais, a edição 2025 do Festival Literário Felisquié, dirigido por Domingos Ailton, que em outubro será dedicada justamente aos italianos e seus descendentes no Brasil. Na ocasião será entregue também o primeiro Prêmio Sante Scaldaferri, em memória do grande artista ítalo-brasileiro nascido em Salvador da Bahia em 1928, que gostava de se definir como “fabricado na Itália e desembarcado na Bahia”. Pintor, cenógrafo e ator, Scaldaferri permanece como um símbolo da dupla identidade que muitos emigrantes reivindicaram com orgulho.
“A imigração italiana no Brasil foi uma verdadeira epopeia, feita de sacrifícios mas também de grandes conquistas”, recordou o professor De Marchis, citando figuras como Francisco Matarazzo Sobrinho, empresário e mecenas, e a escritora Zélia Gattai, exemplos de um patrimônio cultural compartilhado.
O Festival e as iniciativas relacionadas, entre elas um “desfile cultural” dedicado ao impacto dos italianos em Jequié – têm como objetivo reforçar ainda mais o vínculo entre Basilicata e Brasil, não apenas do ponto de vista econômico, mas sobretudo cultural e humano.
“A história que celebramos hoje deve ser transmitida às novas gerações”, destacou Iara Bartira da Silva. “É um patrimônio precioso, que testemunha o quanto os italianos souberam levar beleza e valores aos países em que se estabeleceram.”
Fotografia: Trecchina e Jequié.