Em uma decisão histórica que reacende debates antigos e paixões intensas, o Comitê Interministerial de Planejamento Econômico e Desenvolvimento Sustentável da Itália (CIPESS) aprovou oficialmente o projeto final da tão falada Ponte do Estreito de Messina. O anúncio, feito pelo Ministério das Infraestruturas e Transportes, marca o ponto de partida para uma das obras de engenharia mais ambiciosas da Europa — e possivelmente do mundo — ao conectar, enfim, a Sicília ao continente italiano.
A Ponte do Estreito de Messina promete ser, segundo Salvini, “a maior ponte de vão único do mundo”. Atualmente, o recorde pertence a estruturas na Turquia, Japão e China — mas a engenharia italiana pretende superá-las. A ponte será parte essencial de uma reconfiguração mais ampla da mobilidade entre Calábria e Sicília, integrando-se à futura linha ferroviária de alta velocidade entre Salerno e Reggio Calabria.
Hoje, um trem de carga ou passageiros pode levar de duas a três horas para atravessar o estreito. Com a ponte, esse tempo será reduzido para apenas 15 minutos. Uma economia que promete revolucionar o transporte de pessoas e mercadorias no Sul do país.
Além da ponte em si, o projeto inclui uma linha de metrô com três estações no lado de Messina, oferecendo conexão cotidiana para estudantes, trabalhadores e turistas. A obra, orçada em 13,5 bilhões de euros, está inteiramente coberta por financiamento aprovado — o que representa um avanço inédito em comparação às tentativas frustradas do passado.
Um projeto entre o desenvolvimento e o abismo
Se por um lado o governo celebra o projeto como símbolo de modernização e união territorial, por outro, as reações contrárias foram imediatas e contundentes.
Para Anthony Barbagallo, deputado do Partido Democrata e líder na Comissão de Transportes da Câmara, a aprovação do CIPESS é “um dia triste para o sul da Itália”. Segundo ele, a ponte representa “um colossal desperdício de recursos públicos” e ignora as verdadeiras prioridades da região, como transporte local, saúde, educação e segurança.
Segurança, máfia e a sombra da ‘Ndrangheta
Diante do enorme investimento envolvido, surgem também preocupações sérias com segurança e infiltração mafiosa. Salvini assegurou que “o combate à criminalidade será total e constante”, com protocolos rígidos em parceria com o Ministério do Interior, chegando a afirmar que se houver qualquer risco de envolvimento da máfia ou da ‘Ndrangheta, a ponte simplesmente não será construída”.
A experiência da Itália com grandes eventos como a Expo e as Olimpíadas serve de modelo, segundo o governo, para controlar toda a cadeia de suprimentos e garantir integridade ao projeto.
Impacto urbano e oposição local
No plano local, a ponte não é unanimidade — muito pelo contrário. O prefeito de Villa San Giovanni, Giusy Camini, e todo o conselho municipal, posicionaram-se frontalmente contra a decisão chegando a afirmar que a obra ameaça a sobrevivência da cidade, pois dividirá o território ao meio.
A cidade, que será um dos pontos de ancoragem da ponte no lado continental, teme impactos urbanísticos e ambientais irreversíveis.
Entre o sonho e o ceticismo
A Ponte de Messina é uma ideia que remonta ao século XIX e atravessou décadas de projetos, engavetamentos, protestos e idealismos. Agora, pela primeira vez, um projeto executivo com financiamento garantido está oficialmente aprovado.
Mesmo assim, entre as promessas de desenvolvimento e os alertas sobre riscos estruturais, financeiros e sociais, o país ainda se divide. A ponte, ao que tudo indica, não é apenas uma questão de engenharia, mas um símbolo potente de tudo que separa — ou une — o Norte e o Sul da Itália.
A previsão técnica é que os primeiros trens cruzem o estreito até 2032 ou 2033. Até lá, o desafio será manter o projeto de pé, longe das sombras da corrupção, da lentidão burocrática e da descrença popular. Um vão monumental, que o governo italiano agora se compromete a cruzar — tijolo por tijolo, crítica por crítica.