sex. nov 7th, 2025

A Itália e o paradoxo da aposentadoria: trabalha-se pouco, aposenta-se muito velho

Enquanto o governo italiano discute mais um aumento na idade mínima, que pode chegar aos 70 anos para se aposentar, os números revelam uma ironia digna de tragédia clássica: a Itália tem uma das vidas laborais mais curtas da Europa e, ao mesmo tempo, uma das idades de aposentadoria mais altas do continente.

De acordo com um dossiê publicado pelo “Corriere della Sera”, com base em dados da Eurostat e da Ragioneria Generale dello Stato, os italianos devem trabalhar até quase os 70 anos no próximo futuro, mas sua vida ativa média é de apenas 32,8 anos: quase cinco a menos que a média europeia de 37,2.

Na prática, isso significa que o italiano médio começa a trabalhar tardiamente – geralmente depois dos 25 anos, frequentemente muito depois – e tem uma trajetória marcada pelo precariado, pela instabilidade, por contratos temporários, estágios e longos períodos de desemprego. Como explica o pesquisador Francesco Seghezzi, da Fundação Adapt, o problema começa na transição da educação ao trabalho: “A formação é longa, o mercado é rígido e o primeiro emprego raramente é estável. Cada interrupção significa anos de contribuição perdidos.”

A isso soma-se o fenômeno do trabalho informal, que ainda movimenta quase 9% do PIB italiano e envolve mais de três milhões de pessoas. Essa economia paralela não contribui para o sistema previdenciário, encurtando ainda mais a vida laboral oficial.

O abismo de gênero também pesa. As italianas trabalham, em média, nove anos a menos que os homens — o maior gap da União Europeia. Enquanto nos países bálticos (Estônia, Letônia e Lituânia) as mulheres já superam os homens em tempo de contribuição, na Itália elas continuam presas entre empregos precários, responsabilidades familiares e falta de políticas de apoio.

Outro fator que distorce o sistema são os chamados “baby aposentados”, funcionários que se aposentaram com poucos anos de contribuição (em media 22-25 anos) durante as décadas de 1980 e 1990. Seriam cerca de 400 mil os italianos que recebem aposentadoria há mais de 40 anos: metade deles enquadrados nessa categoria. Esses casos históricos, embora cada vez mais raros, continuam a pesar nas contas públicas e ajudam a explicar a resistência do governo em flexibilizar o sistema.

O resultado é um círculo vicioso: para sustentar um sistema sobrecarregado, o Estado eleva a idade de aposentadoria, mas a estrutura do mercado de trabalho impede que os italianos acumulem tempo de contribuição suficiente. A consequência é uma geração que trabalha menos do que deveria, mas se aposenta cada vez mais tarde: um verdadeiro paradoxo.

Sem contar a depressão demográfica, com pouquíssimas crianças nascendo e um número sempre maior de idosos, aposentados com alta expectativa de vida.
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