O panno Casentino (ou “pano grosso do Casentino”) é um tecido de lã típico do vale do Casentino, na Toscana, cuja história é rica e fascinante. Esta é uma visão geral da sua trajetória: origem, vínculo com a Casa de Saboia, ascensão no mundo da moda – e sua situação atual.
Origens antigas e características técnicas
A produção de lã no Casentino é documentada desde as épocas etrusca e romana. Na Idade Média, castelos e mosteiros da região (como La Verna e Camaldoli) utilizavam a lã local para hábitos e vestimentas robustas. O panno Casentino se distingue por características técnicas muito particulares:
• Lã grossa e resistente, ideal para uso externo e intempéries.
• Tratamentos como garzatura e follatura, que criam o típico efeito crespo na superfície e tornam o tecido denso, quente e resistente à água e ao vento.
• Inicialmente, cores sóbrias: cinzas e tons terrosos predominavam.
Era, portanto, um tecido popular, destinado a camponeses e a quem trabalhava ao ar livre — mas que a moda transformaria em ícone de estilo.
O surgimento do laranja e o uso pela Casa de Savoia
A célebre cor laranja do tecido nasceu quase por acaso: no século XIX, ao tingir o material para capas de carroças e animais de tração, uma combinação inesperada de corantes resultou em um tom laranja-avermelhado conhecido como “becco d’oca”.
Relatos indicam que a Casa de Savoia adotou esse tecido laranja para cobrir cavalos e equipamentos das cocheiras reais, destacando-o pela visibilidade e robustez. A partir daí, as mantas destinadas aos animais transformaram-se em vestimentas — e o Casentino laranja ganhou nobreza.
No fim do século XIX, ele tornou-se peça elegante do guarda-roupa masculino, especialmente para a caça e a vida ao ar livre: casacos pesados, martingalas, golas importantes. Um símbolo aristocrático.
Da elegância masculina à moda internacional: Audrey Hepburn
A fama internacional chegou no século XX. Personalidades como Giacomo Puccini e Giuseppe Verdi já o utilizavam, mas o momento de consagração veio do cinema e da alta-costura.
Hubert de Givenchy escolheu o panno Casentino para um casaco laranja usado por Audrey Hepburn no filme Breakfast at Tiffany’s (1961). O resultado: um salto direto para o imaginário global da moda.
De “tecido da cocheira” a “peça glamour da cidade”: a trajetória perfeita do poder transformador da moda.
O declínio e a fim de uma epoca
Apesar da história gloriosa, hoje o panno Casentino vive um período delicado. A produção diminuiu drasticamente, a concorrência global aumentou, e o número de artesãos especializados continua caindo ate o fechamento da ultima pequena empresa que produzia o tecido.
Por que essa história importa
Para quem trabalha com moda, storytelling e patrimônio, a história do panno Casentino é exemplar:
• Um material humilde que vira símbolo graças à funcionalidade e a um acidente de cor.
• Um vínculo profundo entre território, indústria e artesanato.
• Um processo de elevação cultural — do rural ao cinema de luxo.
• Uma fase recente de retração que evidencia a dificuldade de sobrevivência dos produtos históricos em um mercado globalizado e sua caída.

