Depois de 25 anos de idas e vindas, protestos, negociações paralisadas e mudanças de governo, a União Europeia finalmente desbloqueou o acordo de livre comércio com o Mercosul. Com as novas garantias e salvaguardas propostas pela Comissão Europeia, sobretudo em defesa da agricultura e da segurança alimentar, países como Itália, França e Polônia, antes resistentes, começaram a abrir caminho para a aprovação do tratado.
O braço executivo do bloco ‘dos 27’ atuou concretamente para não desperdiçar a oportunidade de aprovar um acordo considerado estratégico para diversificar suas relações comerciais e fortalecer os laços econômicos e políticos com “parceiros de ideias semelhantes” em todo o mundo. Um movimento ainda mais relevante no atual cenário de guerra comercial global.
Para superar as resistências, foram criadas novas “quotas” e “ salvaguardas”, junto com um fundo de 6,3 bilhões de euros (40 bilhões de reais) que funcionará como uma rede de segurança para apoiar o setor agrícola em caso de dificuldades decorrentes da maior concorrência latino-americana, justamente o ponto central das críticas de vários países europeus.
“Sempre dissemos que o acordo pode representar uma oportunidade para setores como a indústria, o vinho e os queijos, mas também pode penalizar outros, do arroz às carnes vermelhas. Foi aprovada nossa proposta de criação de um fundo para proteger os setores contra desequilíbrios e prejuízos”, comentou o ministro da Agricultura italiano, Francesco Lollobrigida, em entrevista ao jornal La Stampa. Antes de bater martelo “o texto deve ser analisado com atenção junto às associações agrícolas, que sempre consultamos antes de tomar qualquer decisão”, concluiu.
O acordo
O Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai) e a União Europeia juntos formam um mercado de mais de 700 milhões de consumidores e um Pib somado de cerca de 20 trilhões de dólares. O acordo prevê a redução gradual, em alguns casos até a eliminação total, das tarifas de importação sobre 90% dos produtos que circulam entre os dois blocos.
O que isso significa? E o que muda para os brasileiros?
Na prática, o acordo abre espaço para mais exportações do Brasil (como carne bovina, aves, açúcar e frutas tropicais) para o mercado europeu, mas também facilita a entrada de produtos europeus por aqui, e é aí que a vida do consumidor brasileiro pode ganhar um sabor a mais. Para os apaixonados por gastronomia, a notícia é excelente. Hoje, importar vinhos, queijos, massas especiais ou azeites italianos significa lidar com tarifas que chegam a 35% no vinho e até 28% nos queijos. Isso torna muitos produtos inacessíveis ou caríssimos.
Com o acordo, esses impostos vão cair progressivamente, permitindo que mais brasileiros tenham acesso a produtos que antes eram quase exclusivos. Imagine poder comprar um Chianti toscano ou um parmigiano-reggiano autêntico no supermercado por um preço muito mais próximo ao que se paga na Europa.
O Brasil já é um grande parceiro da Itália, e o acordo tende a estreitar ainda mais essa relação. O que vem de lá não é apenas produto: é cultura. A enogastronomia italiana traz consigo séculos de tradição, técnicas artesanais e histórias familiares. Ao mesmo tempo, os italianos terão ainda mais acesso às nossas carnes, frutas e cafés, reforçando a troca de sabores e identidades.
Além da gastronomia, setores como moda, design e automóveis italianos também terão tarifas reduzidas – o que significa mais variedade e preços potencialmente mais competitivos.
Embora ainda faltem etapas políticas e ratificações (pelos parlamento europeu e dos congressos de cada um dos 27 Países) para o acordo entrar plenamente em vigor, o chamado “acordo interino” já pode liberar a parte comercial mais rapidamente, com impacto visível antes mesmo da ratificação completa. Ou seja: em pouco tempo, podemos começar a notar mudanças nas prateleiras dos supermercados, nas cartas de vinhos e nos menus de restaurantes brasileiros.
O que antes parecia um luxo reservado a poucos pode estar prestes a se tornar parte do nosso dia a dia: mais Itália no Brasil, mais Brasil na Europa.