Se as paredes do número 245 do Corso Vittorio Emanuele II pudessem falar, elas não sussurrariam; elas contariam histórias de impérios, revoluções e o nascimento de lendas. Entrar no Caffè Platti, em Turim, não é apenas cruzar uma porta de vidro e madeira: é realizar uma viagem no tempo sem precisar de máquina. Ao celebrar seus 150 anos, este bastião da elegância italiana prova que o luxo mais verdadeiro não é o que brilha, mas o que permanece.
Tudo começou em 1870, quando a placa ainda dizia Liquoreria Principe Umberto. Mas foi o toque dos irmãos Ernesto e Pietro Platti, em 1875, que transformou o endereço em um “salão de festas” cotidiano. Ali, entre espelhos que refletem a luz de lustres seculares e tetos de estuque que parecem rendas de gesso, a elite intelectual da Itália encontrou sua casa.
Imagine-se sentado em uma poltrona Luís XVI, onde o jovem Giovanni Agnelli ou o escritor Cesare Pavese buscaram inspiração. Olhe pela janela: foi exatamente naquele banco de madeira na calçada que, em 1897, estudantes do Liceu d’Azeglio fundaram a Juventus. Cada gota de café servida aqui carrega o peso de uma história que moldou a cultura europeia.
A gastronomia do Platti é um ritual coreografado. À tarde, o café revive o “Lanche Real”, uma tradição da Casa de Saboia que transforma o lanche em instituição. O protagonista? O Bicerin (o icônico mix de café, chocolate e creme de leite) ou um chocolate quente tão denso que desafia a gravidade, escoltado por baci di dama e torcetti que derretem ao primeiro toque da língua.
E então, surge ela: a Torta Platti. Um monumento de chocolate protegido por uma receita tão secreta quanto os arquivos do Vaticano. Quem prova, não apenas come; tenta decifrar o mistério em cada camada.
Mas o Platti também sabe ser salgado e surpreendente. No berço do tramezzino, o café eleva o sanduíche triangular ao status de obra de arte. Não espere o comum. Aqui, os pães de fermentação natural tingidos com tinta de lula ou tomate abraçam recheios audaciosos como língua de vitela com salsa verde ou o creme de gorgonzola doce com nozes. É o equilíbrio perfeito entre a tradição piemontesa e a vanguarda gastronômica.
Porque em um mundo que corre, o Platti convida a caminhar. Ele não precisou de fogos de artifício para comemorar seu sesquicentenário; ele apenas manteve o brilho da prata polida e a cortesia de quem sabe que servir é uma arte. Visitar o Platti é dar um presente à sua própria história. É tornar-se, por uma tarde, parte de uma linhagem de sonhadores que, há 150 anos, escolhem o melhor balcão de Turim para ver a vida passar.


