A Corte Constitucional da Itália publicou nesta quinta-feira, 31 de julho, a sentença n.º 142/2025, encerrando uma das maiores controvérsias jurídicas recentes sobre o reconhecimento da cidadania italiana por direito de sangue (iure sanguinis). Com decisão unânime, o tribunal reafirmou a legitimidade do reconhecimento da cidadania para filhos de italianos nascidos no exterior, mesmo sem vínculo territorial com o país.
A decisão responde a ações enviadas por tribunais de Bolonha, Milão, Roma e Florença, que levantaram dúvidas sobre a constitucionalidade do modelo vigente, vigente desde o Código Civil de 1865 e reafirmado pela Lei n.º 91/1992.
O que estava em jogo?
Os tribunais alegavam que conceder cidadania a milhões de descendentes sem laço direto com a Itália poderia violar princípios constitucionais como:
- Soberania popular (Art. 1),
- Razoabilidade e proporcionalidade (Art. 3).
A Corte, no entanto, rejeitou os argumentos de inconstitucionalidade, afirmando que o reconhecimento por filiação é um direito originário, imprescritível e permanente, e não deve estar condicionado à residência, voto ou outros vínculos ativos com o território italiano.
A relatora, juíza Emanuela Navarretta, foi clara: “O status de cidadão fundado no vínculo de filiação pode ser reconhecido a qualquer tempo, mediante simples prova do nascimento como filho de cidadão italiano”.
Relação com a nova Lei n.º 74/2025
A sentença também delimitou os efeitos da nova legislação, conhecida como Decreto Tajani, que entrou em vigor em 28 de março de 2025 e estabeleceu limites para o reconhecimento da cidadania italiana — como a exigência de vínculo contínuo com o país e a restrição a apenas duas gerações.
A Corte determinou que a nova lei NÃO se aplica aos processos iniciados até 27 de março de 2025.
Com isso, milhares de requerentes — muitos deles na América do Sul, onde a comunidade ítalo-descendente é expressiva — voltam a ter segurança jurídica quanto ao direito à cidadania.
Processos serão retomados
A decisão determina a imediata retomada dos processos suspensos em diversos tribunais, inclusive os que estavam aguardando decisão constitucional. Esses pedidos voltarão a ser julgados com base nas normas anteriores à Lei 74/2025.
Próximos passos: julgamento da nova lei
A sentença fortalece os argumentos das entidades jurídicas que contestam a constitucionalidade da Lei 74/2025. No dia 25 de julho, o Tribunal de Turim aceitou um novo pedido de verificação constitucional, movido pela AGIS (Associazione Giuristi Iure Sanguinis) e pela AUCI (Avvocati Uniti per la Cittadinanza Italiana). A análise deve ocorrer entre o fim de 2025 e início de 2026.
A Corte deixou claro que o Parlamento tem autonomia para legislar, mas qualquer nova norma deve respeitar os limites da Constituição. A Corte recusou, inclusive, interferir legislativamente no tema, afirmando que isso implicaria uma “intervenção manipulativa extremamente complexa e com repercussões sistêmicas”.
Por que a decisão é histórica?
A sentença 142/2025 resgata a essência do vínculo familiar como base do pertencimento, reforça a separação entre os poderes do Estado e traz previsibilidade para milhões de descendentes de italianos no mundo.
Ao reiterar que a cidadania italiana nasce com o sangue, não com a geografia, a Corte marca uma vitória jurídica, simbólica e cultural para todos os que mantêm viva a herança italiana além-mar.

