Em 2013, a cidade de Nola recebeu um reconhecimento histórico: a Festa dos Gigli entrou oficialmente para o Patrimônio Cultural Imaterial da UNESCO. Para os nolanos, os Gigli não são apenas uma celebração religiosa, mas o próprio símbolo de sua identidade, de suas raízes e de sua história coletiva.
O que são os Gigli de Nola?
Os Gigli são gigantescos obeliscos de madeira, com cerca de 25 metros de altura e peso superior a 2.500 quilos. Eles nasceram como evolução de antigos rituais pagãos ligados ao “majo”, uma grande árvore símbolo de fertilidade, que com a chegada do cristianismo foi transformado em sinal de fé e devoção a São Paulino, padroeiro de Nola.
Cada Giglio é sustentado por uma estrutura interna chamada borda, introduzida em 1887, que garante estabilidade e elasticidade durante a dança. Os obeliscos são erguidos nos ombros pelos cullatori (assim chamados pelo movimento oscilante, semelhante ao ato de embalar) e transportados por uma paranza de cerca de 128 homens.
A arte do papel machê
Os Gigli são revestidos com esplêndidas decorações em papel machê, feitas por artesãos locais. Essa tradição chegou a Nola graças à influência de mestres do papel machê de Lecce e decoradores napolitanos. As figuras e ornamentos representam temas religiosos, históricos e até contemporâneos. A técnica é complexa: o papel, misturado com gesso e cola, é moldado em formas, seco e depois pintado com tintas à base de água. O resultado é um revestimento leve, flexível e artisticamente detalhado.
As origens históricas
Segundo a tradição, a festa nasceu da lenda de São Paulino. Durante as invasões bárbaras, o bispo de Nola ofereceu a si mesmo como escravo para salvar o filho de uma viúva. Após ser libertado, conseguiu também a liberdade dos prisioneiros nolanos. Quando voltou, o povo o recebeu com um cortejo de artes e ofícios, levando como presente uma flor: o lírio (giglio). Desse gesto de fé e gratidão nasceu a celebração que até hoje emociona as ruas de Nola.
A festa acontece todos os anos em 22 de junho (ou no domingo seguinte). Os protagonistas são os oito Gigli e a Barca, que recorda o retorno de São Paulino por mar. Cada obelisco representa uma antiga corporação: Hortelão, Charcuteiro, Taberneiro, Padeiro, Barca, Açougueiro, Sapateiro, Ferreiro e Alfaiate.
A Festa dos Gigli
O ponto alto é o Domingo dos Gigli, também chamado ’o juorno cchiù bello (“o dia mais bonito”). Desde as primeiras horas da manhã, os cullatori preparam as estruturas, celebra-se a missa e, após a bênção do Bispo, começa a espetacular Ballata dei Gigli, uma procissão dançante que percorre todo o centro histórico. Os obeliscos se movem ao ritmo de músicas populares, canções napolitanas e arranjos modernos. A festa segue até tarde da noite, muitas vezes até o amanhecer do dia seguinte.
Turismo e comunidade brasileira
Hoje, a Festa dos Gigli não é apenas um evento religioso e cultural, mas também um grande atrativo turístico. Milhares de visitantes italianos e estrangeiros viajam a Nola todos os anos para assistir ao espetáculo dos obeliscos dançantes, transformando a cidade em um palco a céu aberto.
A festa tem uma ligação especial com a comunidade brasileira, numerosa tanto na Itália quanto em Nola. Muitos brasileiros de origem campana retornam anualmente para participar, fortalecendo a ponte cultural entre os dois países. Alguns comitês até introduziram o “Giglio das crianças”, tradição levada pelos emigrantes a Nova York e depois difundida também no Brasil, envolvendo as novas gerações de descendentes nolanos e ítalo-brasileiros.
O chamado “junho nolano”, com eventos, concertos e espetáculos, tornou-se também uma oportunidade de encontro internacional, onde a fé se mistura com a música, o folclore e o turismo.
Um patrimônio que se renova a cada ano
Organizar um Giglio pode custar mais de 100 mil euros, valor sustentado por doações, jantares comunitários e patrocínios. É um esforço que torna cada nolano participante ativo da festa, no espírito do ditado popular: “’a festa tann’ nasc’ quann’ more”, ou seja, “a festa nasce justamente quando termina”, porque logo após o fim de uma edição já começa a preparação da seguinte.