Enquanto as vitrines de Vicenza, no norte da Itália, se iluminam com o luxo da Vicenzaoro, a maior feira de joias do continente europeu, uma sombra paira sobre o setor: parte desse ouro que brilha nos anéis e colares Made in Italy vem diretamente dos garimpos ilegais da Amazônia. A historia esta contada em um reportage do site Uol,
O Brasil exportou em 2024 nada menos que 42% do seu ouro para a Europa. E o destino mais charmoso e simbólico foi justamente a Itália, conhecida como um dos maiores polos mundiais de design e ourivesaria. O problema é que, entre as toneladas de minério embarcadas, há metal que sai de áreas de extração clandestina, muitas vezes em territórios indígenas.
Nos últimos anos, investigações da Polícia Federal e da Receita brasileira revelaram que três grandes refinarias italianas, Italpreziosi, Safimet e Chimet, compraram ouro com indícios de ilegalidade. Em 2021, a Chimet apareceu ligada a metal vindo da Terra Indígena Kayapó, no Pará. Em 2023, a Safimet foi flagrada tentando importar ouro em pó escondido em uma carga de carvão. Já em 2024, a Italpreziosi comprou de uma importadora brasileira envolvida em um esquema de notas fiscais frias, inclusive emitidas em nome de pessoas falecidas.
Todas negam irregularidades e afirmam que atuam conforme a lei. Mas especialistas lembram: se a documentação brasileira é falsificada, aceitar o papel sem checar a origem real equivale a fechar os olhos.
O debate virou uma queda de braço transatlântica.
De um lado, a Federação Nacional de Ourives e Joalheiros da Itália (Confindustria Federorafi) defende que a responsabilidade é do Brasil. Para a entidade, se o sistema de rastreabilidade do país de origem falha, a indústria italiana não pode ser punida.
Do outro, ambientalistas como Martina Borghi, do Greenpeace Itália, afirmam que essa postura é cômoda: “o setor europeu lucra com o ouro amazônico, mas esconde-se atrás da burocracia”.
A crítica é reforçada por dados do Instituto Escolhas, que mostram que 94% do ouro brasileiro importado pela União Europeia vem de áreas de alto risco, sobretudo Pará e Amazonas.
Outro ponto chave é o papel da Suíça, que atua como entreposto: o ouro brasileiro chega ao país, passa por refino e classificação, e de lá é redistribuído para a Itália e outras nações. Ambientalistas chamam esse processo de uma verdadeira “lavagem do ouro”. O metal sai “sujo” do Brasil e chega “limpo” ao coração da Europa.
A União Europeia está prestes a implementar, em dezembro de 2025, a sua lei antidesmatamento (EUDR). A norma vai exigir garantias de que produtos como café, cacau e soja não estejam ligados à devastação de florestas. Mas o ouro ficou de fora. Para o deputado italiano Angelo Bonelli, isso é um erro grave: “A Itália deveria liderar o combate ao ouro do desmatamento. Mas faz o contrário: protege a indústria e abandona a floresta”.
