qua. nov 26th, 2025

Violência contra a mulher: Itália e Brasil expõem números alarmantes e desafios legais no Dia Internacional de Combate

A história desse dia não nasceu em gabinetes políticos, nem em campanhas institucionais. Ela começou no silêncio, um silêncio pesado, ferido e no grito sufocado de três irmãs que se tornariam símbolo de resistência para o mundo inteiro. As irmãs Mirabal, conhecidas como “Las Mariposas”, viviam na República Dominicana nos anos 1950 e se opunham abertamente à brutal ditadura de Rafael Trujillo. Eram jovens, mães, ativistas, mulheres comuns que se recusaram a aceitar que a violência fosse destino.

No dia 25 de novembro de 1960, foram sequestradas, violentadas e assassinadas pelos agentes do regime. O crime chocou o país, mas o que deveria intimidar acabou provocando o contrário: transformou-se em um levante moral que ecoou além das fronteiras dominicanas. A memória das três irmãs renasceu como símbolo de coragem feminina e de denúncia contra a violência silenciosa que tantas mulheres enfrentam todos os dias.

Décadas depois, em 1999, a ONU oficializou o 25 de novembro como Dia Internacional de Combate à Violência contra a Mulher. Não para celebrar uma data no calendário, mas para lembrar ao mundo um compromisso que ainda hoje está longe de ser cumprido: o de proteger a vida, a dignidade e a liberdade das mulheres.

Este dia nasceu de uma dor profunda, mas continua vivo por causa da força de quem transforma sofrimento em luta e medo em voz. Cada vez que lembramos sua origem, não recordamos apenas uma tragédia; lembramos que nenhuma mulher deveria ser silenciada, que nenhuma vida deveria se perder para que o mundo acorde. É um dia que toca o coração porque nos lembra de algo essencial: onde há violência, não há futuro. Onde há coragem e memória, há esperança.

No Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, os números divulgados na Itália e no Brasil confirmam um cenário grave e persistente, que continua a exigir respostas firmes do Estado e da sociedade. O presidente italiano, Sergio Mattarella, voltou a condenar com dureza o fenômeno, afirmando que “a violência contra as mulheres é uma barbárie incompatível com qualquer ideia de civilização” e que o país deve enfrentar essa emergência “com educação, prevenção e políticas concretas, não com indignação passageira”.

A Itália e o relatório que acende um novo alerta

De 1º de janeiro a 20 de outubro de 2025, 85 mulheres foram assassinadas na Itália, vítimas de homicídio voluntário. Apesar de uma leve diminuição em relação ao mesmo período de 2024 (102 casos), a incidência em relação ao total de homicídios é a maior já registrada: mais de uma em cada três vítimas de homicídio é mulher.

O 12º Relatório Eures confirma a distribuição territorial:
– Norte: 41 vítimas (48,2%)
– Sul: 25 vítimas (29,4%)
– Centro: 19 vítimas (22,4%)

A Lombardia apresenta o cenário mais crítico, com um aumento de 64,3% em relação a 2024 (de 14 para 23 vítimas).
Milão se torna a cidade mais atingida em 2025, com 12 feminicídios — quatro vezes mais que no ano anterior.
Também preocupam os números de Nápoles (7 vítimas, contra 1 em 2024) e Roma (6 vítimas, em queda diante das 11 de 2024).

Outro dado que chama atenção é o aumento das vítimas estrangeiras: representam 31,8% do total e enfrentam um risco cinco vezes maior que as italianas. Em 35,7% dos casos, essas mulheres foram assassinadas por homens italianos.

Os dados mostram uma escalada de crueldade:
Armas brancas foram usadas em 40% dos casos (34 mulheres).
Homicídios com as mãos representam 25,9% — índice associado a maior violência direta.
Os casos de “overkilling” — quando há múltiplos golpes ou violência excessiva — subiram de 3 casos em 2024 para 13 casos em 2025, chegando a 22,4% de todos os feminicídios.

Esses números reacendem o debate iniciado com casos emblemáticos, como o assassinato de Giulia Cecchettin (2023) e de Vanessa Ballan (2024), que mobilizaram o país e aceleraram reformas legislativas recentes dentro do Código Vermelho, endurecendo medidas protetivas e prisões preventivas.

O Brasil: números ainda mais dramáticos

Enquanto a Itália debate seu aumento de agressões, o Brasil enfrenta um problema ainda maior em termos absolutos. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o país registra aproximadamente 1.400 feminicídios por ano, uma mulher assassinada a cada seis horas.

Além disso, mais de 250 mil casos de violência doméstica são oficialmente denunciados anualmente, apesar da grande subnotificação.

Legislação robusta, mas ainda insuficiente

O Brasil possui leis consideradas avançadas:
• Lei Maria da Penha (2006): marco de proteção, medidas protetivas e políticas integradas.
• Lei do Feminicídio (2015): enquadra o feminicídio como qualificadora do homicídio, com penas maiores.
• Delegacias da Mulher, aplicativos de denúncia e medidas de urgência digitais também ampliaram o acesso das vítimas ao sistema de proteção.

Mas, assim como na Itália, os especialistas reforçam que legislações fortes não bastam se não houver políticas sociais contínuas, educação de base e combate ao machismo estrutural.

Duas realidades, o mesmo desafio

No Brasil ou na Itália, os números mostram que a violência contra a mulher não é um evento isolado, mas sim um fenômeno de raízes profundas. No Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher, os dados reforçam que a luta exige:
políticas de prevenção constantes, proteção eficaz e rápida, punição imediata, e, sobretudo, transformação cultural.

Como afirmou Mattarella, proteger as mulheres “é proteger o próprio futuro de uma sociedade civilizada”.

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